quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Vidas - III

Passar a noite nas urgências de um hospital é daquelas coisas que todos nós detestamos... mas, por outro lado, traduz-se num bom momento de reflexão.
Eu, por exemplo, descobri que não quero chegar a velha. Aquele tom de voz "então tiazinha, o que lhe aconteceu?" irritou-me. Será que ao entrar no hospital as pessoas deixam de ter nome?
Já não basta estarmos doentes, sentirmo-nos mal e ainda temos de aturar isto?
Fiquei quase como o João, que faz hoje quatro anos e que está a sair daquela fase difícil para qualquer mãe, que é a idade dos porquês... Apeteceu-me ser como ele. Questionar tudo e todos... Sim, PORQUÊ?
Porque é que se perdeu a solidariedade?
Porque é que se deu perdeu a humildade?
Porque é que se perdeu o espírito de humanidade?
Porque é que se perdeu o apreço pelos valores morais?
Porquê???


Essas Coisas
«Você não está mais na idade de sofrer por essas coisas.»
Há então a idade de sofrer e a de não sofrer mais por essas, essas coisas?
As coisas só deviam acontecer para fazer sofrer na idade própria de sofrer?
Ou não se devia sofrer pelas coisas que causam sofrimento pois vieram fora de hora, e a hora é calma?
E se não estou mais na idade de sofrer é porque estou morto, e morto é a idade de não sentir as coisas, essas coisas?

Carlos Drummond de Andrade, in 'As Impurezas do Branco'

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